terça-feira, março 26, 2019

Estrada dos Morais

Por Mirian Bondim


Uma estrada colonial com histórias pra contar...

Um antigo caminho de tropas em Mangaratiba, denominado historicamente como “Estrada dos Morais”, tem muitas histórias pra contar. Essa pequena vereda, que começa na “Toca da Velha” e segue em direção à praia do Saco contornando o “Morro dos Morais”, foi aberta em 1821, num período anterior a emancipação política do município, em 1831.

Em 1833, ocorreu uma grande confusão na pequena localidade, relacionada a essa via. Tudo aconteceu porque o comendador Joaquim José de Sousa Breves (Rei do Café e um dos maiores escravocratas do país) arrematou e administrou a obra da construção de uma estrada para São João Marcos e, apesar de ter recebido donativos dos moradores da vila para tal empreitada, só levou a estrada até o povoado do Saco, local de seus estabelecimentos, não incorporando as obras de melhorias na “Estrada dos Morais” que facilitaria o trânsito das tropas de café até o antigo porto (trapiche) da vila.

Tal fato despertou a ira das autoridades mangaratibenses que passaram a perseguir Breves, através de ações prejudiciais aos seus negócios envolvendo o tráfico negreiro. Entre essas ações, está a apreensão de uma de suas canoas no momento do desembarque de escravos na praia do Saco e o fechamento da via (“Estrada do Conguinho”) por onde os negros traficados eram levados para serem leiloados em um dos seus estabelecimentos.

A confusão aumentou porque Breves subornou o delegado e conseguiu pegar os escravos apreendidos e, em 1837, totalmente enfurecido, desceu a Serra do Piloto e atentou (com grupo de +/- 100 pessoas armadas) contra a vila.


A partir daí, a Câmara Municipal de Mangaratiba passou a enviar queixas à Província, acusando Breves e o Conrado Jacob Niemayer (engenheiro obra da estrada) de serem os responsáveis pelo isolamento da vila e passaram a solicitar a construção de um bom porto na localidade. Obra que só iria acontecer, em 1857, com a construção da Estrada Imperial, sob a coordenação do engenheiro Eduard Webb, que abriu o caminho pela costeira, quebrando muitas pedras para chegar ao trapiche da cidade (atual estaleiro Sapeca). Vale ressaltar que o porto de Mangaratiba foi totalmente reconstruído durante essa empreitada.

Apesar de toda essa confusão, o problema da “Estrada dos Morais” foi resolvido em 1834, com os comerciantes e moradores de Mangaratiba, novamente colaborando com donativos para a tão almejada obra, que foi arrematada e concluída por José de Barros Santos.

Além de melhoramentos com calçamentos em pedra pé de moleque, essa histórica estrada de tropas foi arborizada em 1849, com plantação de jaqueiras e figueiras do mato, em toda sua extensão. Uma jaqueira na “Toca da Velha” continua firme e forte há 170 anos, marcando o início desse histórico caminho.

Como, em 1857, foi aberta uma nova via (Estrada Imperial) até o trapiche da vila e a “Estrada dos Morais” ficou parcialmente abandonada, essa via ainda apresenta, em alguns trechos, o calçamento em pé de moleque de 1834, e parte da arborização de 1849, compondo um belíssimo cenário para as atividades do ecoturismo histórico-cultural de Mangaratiba. 

Sábio é o povo que preserva sua história e seus patrimônios históricos!

Mirian Bondim é arqueóloga e historiadora.

Originalmente postado em Paraíso Costa Verde

Postado neste blog por Adinalzir Pereira Lamego

2 comentários:

Laura Aguiar disse...

Mangaratiba, um lugar apaixonante e com muita história.
Amei o texto!

Adinalzir disse...

Prezada Laura Aguiar
Agradeço pela visita e volte sempre!