Tour leva cariocas a redescobrirem a história da Marechal Floriano, uma importante avenida do centro do Rio de Janeiro.
Rota de escravos, ponto de ciganos e prostitutas, endereço de festas da elite, canteiro de obras de Pereira Passos, centro comercial popular. Em quase 250 anos, a Avenida Marechal Floriano entrou no mapa de todas as classes sociais. Presidentes estudaram e moraram ali, negros foram negociados como mercadorias, uma princesa caminhou rumo ao altar. Seu passado multifacetado é, desde o início do mês, tema de um tour histórico nas manhãs de sábado, patrocinado pela Light e pela ONG Instituto Cidade Viva. O programa gratuito, concebido para atender a 200 pessoas, já tem uma fila de espera de de 1100 curiosos.
O belo edifício em estilo renascença americana, construído em 1911, na antiga Rua Larga, que foi sede e garagem de bondes da Light e que abriga desde 1994, o centro cultural da empresa.
A abertura da via, em 1763, impressionou os moradores da cidade, recém promovida a capital da colônia. Seus 20 metros de dimensão horizontal lhe fizeram ser batizada de Rua Larga. A extensão privilegiada veio da missão que carregava desde o nascimento. Seria aquele o caminho entre o mercado de escravos do Valongo ( a atual Rua Camerino) e o Campo de Santana, onde os negros eram contratados para pequenos trabalhos. A via logo tornou-se ponto de escoamento de sal, frutas e outros produtos que aportavam no Rio.
Mesmo fundamental para a economia carioca, a rua não era bem freqüentada em seus primeiros tempos. Prostitutas, ciganos e estivadores constituíam o grosso de seu público e afastavam a elite. A elite começou a descobrir a via quase um século depois, a partir de 1831.
- A Lei Eusébio de Queirós proibiu o tráfico interatlântico de escravos e acabou com o mercado do Valongo – conta a historiadora Priscila Melo, que, junto ao marido Raul Melo, apresenta a rua nos tours de sábado. – Muitos empreendedores e comerciantes começam a construir casas na região. Um marco dessa nova fase é a construção do Itamaraty.
O palacete, em estilo neoclássico, recebeu esse nome em homenagem ao seu festeiro idealizador, o Barão de Itamaraty. O nobre usava a edificação apenas como casa de festas – não havia quartos, apenas salões.
A presença do governo na vizinhança valorizou ainda mais a via. Em uma ponta havia as tropas imperiais, agrupadas no terreno que, hoje, serve ao Palácio Duque de Caxias. Na outra extremidade da rua, próxima à atual esquina da Camerino com a Marechal Floriano, o antigo seminário de órfãos de São Joaquim passou por uma reforma e deu lugar ao Colégio Pedro II, o primeiro de educação secundária do país.
A escola logo tornou-se um símbolo de excelência do ensino federal – lembra Priscila. – Entre os seus alunos, estão presidentes da República Velha, como Hermes da Fonseca e Nilo Peçanha. Ainda assim, o historiador Capistrano de Abreu pediu demissão do cargo de professor, por achar os estudantes burros demais.
Ao lado do seminário – e, depois, do colégio -, ficava a Igreja de São Joaquim. À sua frente, estava a Rua Larga. Atrás, uma via com apenas cinco metros de largura, que logo ganhou o apelido de rua Estreita. D. Teresa Cristina margeou este caminho quando descia a Rua do Valongo, em direção ao altar e a D. Pedro II.
O templo, porém, não sobreviveu ao “bota abaixo” do prefeito Pereira Passos. Entre 1904 e 1905, o alcaide mandou demolir a igreja e alargou a Rua Estreita. A Marechal Floriano, assim, ganhava o tamanho e os contornos atuais. O status de avenida veio nos anos 20. A homenagem ao segundo presidente do Brasil também foi idealizada por Pereira Passos.
- Pouco após a proclamação da República, o governo federal comprou o Itamaraty e transformou-o na residência presidencial – explica Priscila. – Deodoro da Fonseca e, depois, Floriano Peixoto moraram ali. O sucessor dele, Prudente de Morais, foi o responsável por transferir esta função para o Palácio do Catete.
A via permaneceu importante para a sociedade carioca até a década de 1940, quando uma nova megareforma a isola do centro comercial nervoso da cidade.
Interventor federal no Rio durante o Estado Novo (1937-1945), Henrique Dodsworth teve a sua sanidade mental contestada pela população ao anunciar a abertura da Avenida Presidente Vargas. Uma via daquele comprimento parecia desnecessária à época. E abrir o caminho para as novas pistas era missão das mais complexas. A demolição atingiu ao menos 14 quarteirões. Ruas inteiras desapareceram e três igrejas seculares foram reduzidas a escombros. A Praça da República, que chegava à porta do Palácio Duque de Caxias, perdeu boa parte de seu tamanho.
- As ruas que ligavam a Marechal Floriano ao Saara foram cortadas – destaca Priscila. – A distância imposta pela nova avenida desestimulou os consumidores de lá a atravessá-la.
Nem o Itamaraty e o Pedro II impediram a Marechal Floriano de transformar-se em uma mera passagem para a Central do Brasil. Opções de lazer, como os cinemas Floriano e Primor, fecharam as portas.
O isolamento, embora fatal para o comércio, teve lá suas vantagens. Longe da mira da especulação imobiliária, a via ainda tem boa parte de seu casario de pé – embora nem sempre preservado.
Excluída dos projetos de revitalização do Centro, a avenida tenta estabelecer o próprio calendário de eventos. Exposições no Largo de Santa Rita e passeios pelo Morro da Conceição, ambos nas adjacências, têm levado os cariocas a redescobrirem a Marechal Floriano. A antiga Rua Larga, de tantas faces, pode virar mais uma página de sua história.
Texto de Renato Grandelle, publicado no jornal O Globo em 28/05/2011.
18 comentários:
Olá, Professor!
Eu passo diariamente por essa avenida e ainda não conhecia essa história. Meus parabéns! Seu blog é um grande aprendizado.
Abraços.
É uma verdadeira aula de história dada a cidade do Rio de Janeiro, por isso que gostamos muito daqui.
Aproveito para dizer que ganhou quatro votos no Top Blog de nós aqui de casa, e por sermos de diferentes temas solicito que possa me conseguir alguns votos.
Abraço
Oi, Professor Adinalzir.
Um texto que vou guardar para estudar mais o assunto.Muito bom!
Na torcida pelo Saiba História no Top Blog 2011!!!!
Leandro CHH
Visitar esse blog e sempre um agradável passeio pela história, mormente carioca. É por isso que sempre voto neste site para o Top Blog.
Abraços, Franz
Amigo Adinalzir, meu endereço do Hotmail foi desativado não sei pq. E não recebo mais nenhuma msg do Blogs Educativo. Já abri novo endereço, masa gostaria de acompanhar o tema "Ainda Amanda Gurge". Sabe se houve resposta a minha msg sore o assunto? Caso tenha havido, vc pode me enviar para o gmail?
Agradeço,
Franz
Olá, Janaína!
Adorei sua visita e fiquei muito contente com seu comentário.
Volte sempre e muito obrigado!
Prezado Lucidreira
Fico muito grato pelo apoio e elogio. Conte comigo que eu também estarei votando no seu blog.
Abraços, e aguarde a minha visita!
Caro Prof. Leandro CHH
Receber sua visita é sempre uma honra para mim. Conte também com o meu apoio. Fico muito grato!
Valeu Franz!
Fico muito grato pela visita.
Um grande abraço!
Caro Franz
Tenho duas mensagens que eu poderei enviar. Só gostaria que me mandasse o seu e-mail do gmail.
Muito obrigado pela visita!
Avenida muito charmosa e cheia de histórias. Quem sabe um dia eu também passe por aí né? Abraço.
Muito legal
Olá, professor!
Não sabia nem um décimo da história desta importante avenida...
Valeu por mais essa! Abraço!
Caro Professor Josimar
Será um grande prazer recebê-lo um dia para uma tournê pela Avenida Marechal Floriano. E por que não? Rsrs. Grato pela visita e um grande abraço!
Valeu, Lotrecio
Muito obrigado pela visita.
Abraços!
Prezado Victor Faria
Como sempre, a nossa meta é divulgar conhecimento e aprender sempre. Valeu pela visita e um grande abraço!
MUITO LEGAL ESSA AULA DE HISTORIA. EU FUI MOTORSITA DE ÕNIBUS, CENTRAL OSORIO. E DEPOIS ESTRADA FERRO IPANEMA. E DEPOIS CENTRAL G OSOSRIO SEMPRE PASSANDO NA AV MARECHAL FLORIANO. E NÂO SABIA DESSA RICA HISTORIA.. QUE MARAVILHA PROFESSÔR. O SR E O MAXIMO...
Minha gratidão ao amigo cgchokito@gmail.com pelo gentil comentário!
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