terça-feira, maio 11, 2021

Memórias do Cárcere



O complexo penitenciário da Rua Frei Caneca já não existe, mas aqui ficou o pórtico monumental que o guarneceu por tanto tempo. Foi atrás dele que existiu o primeiro presídio do país, inaugurado ainda no Segundo Império – mais precisamente, em 1850. Com várias ampliações e adaptações, a antiga Casa de Correcção funcionou ininterruptamente até meados dos anos 2000. As primeiras construções custaram, na época, 200:000$000 rs (duzentos mil contos de réis) e levaram mais de vinte anos para serem concluídas devido a... superfaturamentos e desmandos de políticos, males crônicos da sociedade brasileira. 

Ainda assim, a prisão representou um avanço, pois marcou a adesão do Brasil a mudanças internacionais que vinham sendo implementadas no tratamento aos detentos ao longo do século 19. Antes meramente confinados e submetidos a castigos físicos, os presos passaram a contar com assistência médica e religiosa, acesso a bibliotecas, oficinas de trabalho e atividades recreativas. Aqui estiveram confinadas personalidades do mundo acadêmico e cultural, como o escritor Graciliano Ramos – autor da obra que empresta o título a estas linhas – e a psiquiatra Nise da Silveira, presos por seu envolvimento com a Intentona Comunista de 1935, além do ator Mário Lago, em consequência do Ato Institucional nº 5, em 1968. Bandidos famosos da crônica policial carioca mais recente também cumpriram pena atrás das enormes muralhas, como José Carlos dos Reis Encina, vulgo Escadinha, e Paulo Roberto Moura, o Meio-Quilo. Este último foi morto durante uma rocambolesca tentativa de fuga, a bordo de um helicóptero.

No átrio, em letras garrafais, à vista de todos os condenados que chegavam, uma mensagem dava o tom da instituição: “O preço da liberdade é a eterna vigilância”. Aos domingos, centenas de pessoas faziam fila ao longo da Frei Caneca, aguardando a revista antes das visitas. Verdadeira cidade com milhares de ocupantes, o presídio chegou a ter várias unidades prisionais e dezenas de pavilhões, dos quais não resta nada. Implodidas entre 2006 e 2010, as instalações deram lugar a um conjunto residencial. Ficam as histórias humanas escritas em cada uma de suas extintas celas, na permanente luta entre o bem e o mal que caracteriza os humanos e faz nossa espécie singular. Essa relação ancestral fica consubstanciada na expressão latina escrita nas duas laterais do portão: “Criminosos corrigidos, sociedade livre.”

Compartilhado do Passeador Carioca

Postado neste blog por Adinalzir Pereira Lamego

3 comentários:

Manoel Carlos da Silva disse...

Adorei essa postagem. Passava sempre por lá e não sabia.

Adinalzir disse...

Prezado Manoel Carlos da Silva
Te agradeço pela visita e comentário.
Grande abraço!

Adriana disse...

https://lendoabibliablog.blogspot.com/

legal gostei das postagens.