terça-feira, julho 28, 2020

A Baía de Guanabara em 1500


Figura 5.1 Baía de Guanabara em 1500 (AMADOR, 1997)

O período compreendido entre 1400 e 1850 foi conhecido como pequena idade do gelo, que correspondeu a uma fase de frio intenso e grandes nevascas que assolaram a Europa e a Ásia. Esse evento climático teria impulsionado portugueses e espanhóis a empreenderam a aventura das grandes navegações em direção às Índias e outros horizontes à procura de especiarias, novas fontes de alimentos e mercados, a fim de impulsionar o mercantilismo, que culminou com o (des) cobrimento da América (1492) e do Brasil (1500).

Esse período mais frio teria correspondência com uma provável redução do nível relativo do mar na ordem de 10 a 30 cm. Em decorrência desse evento climático de escala global, provavelmente a Baía de Guanabara em 1500 apresentasse uma posição de nível do mar ligeiramente mais baixo que a atual, da ordem de 10 a 20 cm.

A superfície total da baía, incluindo as ilhas, com seus 60 km2, era de 528 km2 e, sem incluí-las, era de 468 km2.

Em 1500, o mar batia diretamente em áreas como o Outeiro da Igreja da Glória, a base do Morro da Viúva, os Arcos da Lapa, o Teatro Municipal, o Campo de Santana, o túnel do Pasmado, a base do Outeiro da Penha e a Rodoviária Novo Río.

Com base na taxa de assoreamento geológico ou natural determinada para a baía, que era de 13,4 cm/século, a sua profundidade média em 1500 seria de 9,35 metros. Sendo de 17,60 metros na área externa da baía, de 9,38 m na sua porção intermediária e de 4,16 m na área do fundo da baía.

A Baía de  Guanabara dos povos tupis-guaranis possuia uma nítida subdivisão. O termo niterói (água escondida) se aplicava para as enseadas da porção de entrada da baía, enquanto guanabara (seio do mar) representava a parte interior da baía, ou a baía propriamente dita, na concepção moderna de ambientes costeiros. Por outro lado, paranapuan era o canal largo, situado entre a Ilha de Paranapuan (Governador) e o continente.

A paisagem era majestosa, o mar batia diretamente nós pontões e costões que emolduram a Guanabara. Os manguezais estendiam-se por quase todo o litoral, orlando enseadas e estuários, assegurando a produtividade biológica da baía. Dezenas de lagunas e brejos alinhavam-se na retaguarda de restingas tangenciadas por praias de areias alvas. Pitangueiras, guriris, clúsias, cajueiros, bromélias, orquídeas e cactos enfeitavam os cômoros de restingas e dunas.

Os rios de águas transparentes descreviam meandros, antes de atingirem amplos estuários e enseadas. As ilhas paradisíacas, os morros e as serras eram cobertos por uma exuberante floresta tropical, habitat de uma abundante e variada fauna.

Dezenas de aldeias indígenas orlavam a baía, utilizando de forma harmoniosa a sua riqueza biológica. Os índios, organizados num socialismo primitivo, não acumulavam riquezas e tiravam da natureza apenas o necessário para o sustento. Assim já faziam seus ancestrais que, desde a formação da baía, há cerca de 6000 anos, acompanharam e se adaptaram às transformações ambientais que a natureza sofria.

Com uma grande diversidade de ecossistemas periféricos bastante produtivos, como manguezais, lagunas, brejos e pântanos com elevada produtividade primária e secundária; possuindo no seu entorno acidentado inúmeras reentrâncias e saliências, como estuários, enseadas, sacos, gamboas, pontões e costões rochosos, restingas, praias e ilhas, e ainda sendo fertilizada pela constante troca de água doce (de origem fluvial) e marinha, a produtividade e a diversidade biológica da baía eram elevadíssimas, permitindo a proliferação de uma extensa cadeia de organismos, desde os minúsculos fito e zooplânctons, algas, crustáceos, moluscos e peixes, até os grandes os grandes mamíferos aquáticos, como os golfinhos e as baleias.

Em suas águas e nos ecossistemas periféricos proliferavam imensos cardumes de sardinhas, tainhas, xereletes, cocorocas, corvinas e robalos; enormes colônias de moluscos, como mexilhões, ostras, samanguais, berbigões e sernambis; muitos camarões; e diversos tipos de caranguejos e siris, que lotavam os manguezais e as praias.

Os golfinhos em grandes grupos percorriam a baía até as proximidades da Ilha de Paquetá, atraídos pelos imensos cardumes, principalmente de sardinhas.

Nos meses de inverno, entravam nas águas da baía grupos de 40 a 50 baleias, que utilizavam as águas costeiras mais quentes para parirem seus filhotes. As baleias que visitavam a baía eram principalmente jubarte, espadarte, rorqual e cachalote.

Essa diversidade e riqueza de fontes de proteínas atraiu desde a formação da baía, há mais de 6000 anos, populações de povos coletores, pescadores e caçadores.

Como decorrência da lenta e complexa modelagem da paisagem que se processou durante os tempos geológicos, combinada com mudanças ambientais de clima e nível do mar, foi produzido na Baía da Bacia da Guanabara um diversificado complexo de ecossistemas que incluía a Mata Atlântica, campos de altitude, manguezais, brejos, alagados, pântanos, lagunas, restingas, dunas, praias, rios, estuários, enseadas, sacos, gamboas, ilhas, lajes, coroas, costões e pontões rochosos, falésias e feições ruiniformes.

Em 1500, poucos anos antes do desastre da invasão e da colonização européia, era este o quadro ambiental e humano da Guanabara.

Fonte e crédito de imagem:  Figura 5.1
Amador, Elmo da Silva. Bacia da Baía de Guanabara: características geoambientais, formação e ecossistemas / Elmo da Silva Amador. - Río de Janeiro: Interciência, 2012. páginas 369 a 371.

Pesquisa feita por Adinalzir Pereira Lamego

domingo, julho 26, 2020

Thomas Ender, pintor, aquarelista e desenhista


Reprodução - Thomas Ender

O austríaco Thomas Ender deve ser incluído, entre os chamados pintores viajantes, que também veio ao Brasil a partir até  da época do príncipe regente D. João VI até os últimos anos do século XIX. Pintor, aquarelista e desenhista, aos 13 anos, iniciou seus estudos na Academia de Belas Artes de Viena, dedicando-se com pinturas de paisagem e aquarela, recebendo vários prêmios na academia, com destaque para o Grande Prêmio de Pintura, de 1817, na categoria paisagem. O quadro premiado teve o príncipe Metternich, como seu principal patrocinador.

Em 1817, vem ao Brasil na Expedição Científica de História Natural que acompanha a comitiva austríaca, por ocasião do casamento da arquiduquesa Leopoldina com D. Pedro I.

Igreja de Santana e o Chafariz das Lavadeiras no Campo de Santana.

Em sua curta permanência no Brasil, devido a problemas de saúde, pintou panoramas do litoral e cenas urbanas. Apesar de executar mais de 700 obras, entre desenhos e esboços, sobre o Brasil, não publicou seu trabalho, do qual era considerado material. No entanto, algumas de suas criações aparecem em livros de cientistas naturalistas da época. No Rio de Janeiro, esse artista registrou suas obras, dando destaques as igrejas, os edifícios públicos, as praças e seus arredores.

Vista do Rio, de 1817

Retratou a sociedade brasileira da época e a escravidão, enfocando um modo crítico, se interessando especialmente pelas diversas nacionalidades dos escravos. Em 1818, fez parte da comissão para uma viagem científica com afamados integrantes que se dividiram para explorar diferentes regiões. Ender seguiu inicialmente com Spix e Martius, em regiões do Rio de Janeiro e São Paulo e Minas Gerais, pela Estrada Real, registrando paisagens e cidades. No regresso ao Rio de Janeiro, adoeceu gravemente e retorna, levando os desenhos e aquarelas relativos à viagem, que em grande parte se encontram atualmente no Gabinete de Gravuras da Academia de Belas Artes de Viena.


Todo o seu trabalho, revelou ao europeu um Brasil de beleza incomum. Para historiadores, junto com Debret e Rugendas, Thomas Ender fecha a trilogia de desenhistas e pintores que passaram pelo Brasil no início do século XIX e que registraram imagens de um país, que saía da condição de colônia, e experimentando uma nova vida, primeiro como Reino Unido a Portugal e Algarves, e depois, como um país independente.

Fonte e crédito das imagens: Brasiliana Iconográfica

Pesquisa feita por Adinalzir Pereira Lamego

sábado, julho 25, 2020

Guido Pokrane, chefe de Botocudos de Cuieté, Minas Gerais



Retrato de Guido Pokrane, chefe dos Botocudos de Cuieté, Minas Gerais. Conhecido como "O Imperador do Rio Doce" 1840. Guido era um cacique botocudo, convertido ao catolicismo em 1824 por ação do colonizador francês Guido Marlière. Filho de um chefe Botocudo, foi recrutado pelos homens de Marlhiére nas margens do Rio doce , ele aceitou ser batizado e passou a trabalhar na catequização de outros índios.

Pokrane atuou como intérprete de Marlière e era seu acompanhante predileto no desbravamento de florestas do interior de Minas Gerais. Quando Guido Marlhiére deixou o serviço de Colonização dos índios, o botocudo Guido Pokrane foi o líder da pacificação dos índios da Região, chefiando a construção de uma povoação na barra do Cuieté, em frente ao novo aldeamento dos naknenukes no Rio Laranjeiras. Pokrane também combateu os índios puris, antigos inimigos dos botocudos. Outros aldeamentos foram criados para os pejuarim-krakmuns no Ribeirão do Travessão. Ficou conhecido como "Imperador do Rio Doce" por seu poder de liderança.

Em 1843 teve a posse de suas terras usurpada por Manuel António de Sousa. Mesmo com a invasão de suas terras, Pockrane não hostilizou os brancos, passando a fornecer-lhes mantimentos e a prestar-lhes ajuda. Guido Pokrane foi assassinado por índios Mek-Mek, rivais dos botocudos em 1850, causando grande comoção entre os colonos europeus e os índios aldeados de Minas Gerais. O chefe botocudo era conhecido pelo exército como "o melhor amigo dos brasileiros".

A região em que estavam suas terras se tornaram, em 1879, uma freguesia paroquial pertencente ao atual município de Vermelho Novo, na paróquia de Ponte Nova em Minas Gerais. 


Originalmente postado na página Brazil Imperial

Postado neste blog por Adinalzir Pereira Lamego

quinta-feira, julho 23, 2020

A criação de gado e a construção dos canais na antiga Fazenda de Santa Cruz



Por Manoela da Silva Pedroza

"Tem-se notícia de gado nos pastos já em 1610. Em 1614 já nasciam, por ano, mil e quinhentas cabeças. Em 1621 já existia o arraial, sede da fazenda. Nestes anos foi preciso secar os chamados “Campos de Guaratiba” e construir os currais. Para tanto, os padres abriram uma vala larga e profunda com quase 14 quilômetros de extensão, para combater enchentes, drenar os campos, servir de bebedouro ao gado e canal para embarcações: a “Vala dos Padres”, mais tarde conhecida como Canal do Itá. Em seguida, construíram o Canal de São Francisco, com dez quilômetros de extensão, a Vala da Goiaba, a Vala do Cação Vermelho e a Vala do Piloto. Outras valas e pequenos canais foram abertos mais tarde. Os padres envolveram os índios aldeados na construção de diques de terra (o mais extenso sendo a “Taipa Grande”, com sete construíram o Canal de São Francisco, com dez quilômetros de extensão, a Vala da Goiaba, a Vala do Cação Vermelho e a Vala do Piloto. Outras valas e pequenos canais foram abertos mais tarde. Os padres envolveram os índios aldeados na construção de diques de terra (o mais extenso sendo a “Taipa Grande”, com sete quilômetros, e depois a “Taipa do Frutuoso”, com mil e seiscentos metros) e um sistema de comportas e óculos, para prevenir o alagamento dos campos na época de cheia dos rios Itaguaí e Guandu ou, nos tempos de enchente, liberarem a água retida. Os padres mandaram fazer também a abertura do ‘caminho dos jesuítas’, ligando a Fazenda à de São Cristóvão, mais tarde chamado ‘caminho das minas’ e, depois, ‘estrada real de Santa Cruz’. Todas estas obras foram executadas pela mão-de-obra indígena aldeada e já estavam concluídas em 1640, criando vastíssimos campos bastante apropriados para a criação de gado e, portanto, sua toponímia passou a “Fazenda dos Corraes”. 

A partir da segunda metade do século XVII, a Fazenda se concentrou na criação de rebanhos e pastos, e no seu aumento, em quantidade e qualidade. Padre Antônio Forte, reitor do colégio do Rio em meados dos seiscentos, era da opinião de que todo o gado que a Companhia criava na capitania do Rio de Janeiro deveria ser concentrado na Fazenda de Santa Cruz, que as outras fazendas deveriam ser vendidas e que o dinheiro deveria ser aplicado na melhoria desta. Assim o fizeram. Construíram valas e taipas, secaram os campos, construíram cerca de trinta currais, implantaram novas forragens, retiraram ervas daninhas (pelas mãos das crianças escravizadas). Os padres tinham sessenta escravos campeiros e mais tantos outros curraleiros, especializados em juntar, proteger, guardar, ferrar, contar e tratar do gado, dispensando inclusive um tosco atendimento veterinário. Essas atividades mostram o empenho dos jesuítas em realmente montarem um enorme e lucrativo complexo criatório nas terras de Santa Cruz, movido pela população escravizada. 

Deu certo. A Fazenda, já em 1641, provinha 41% da renda deste colégio, através da venda do gado. Em 1659, o reitor dizia que “com os juros, os recursos obtidos com o engenho e o curral de Santa Cruz, o aluguel de casas e a renda doada pelo Rei poder-se ia sustentar dois colégios iguais aos do Rio de Janeiro”, indicando a boa lucratividade daquele empreendimento. No final do século XVII, a Fazenda possuía 17.050 cabeças de gado distribuídas em 47 currais, além de 1800 cavalos e alguns carneiros. Isso representava um terço dos rebanhos de toda capitania. Na primeira metade do século XVIII a criação diminuiu um pouco, e se estabilizou. Em 1711, o padre jesuíta Antonil, passando pelo Rio, registrou que a Fazenda tinha quinze mil cabeças de gado, “um quarto do rebanho de toda capitania”, e que era o único lugar da cidade do Rio de Janeiro que possuía currais”. Em 1711, quando o Rio de Janeiro foi invadido pelos franceses, foi estabelecido que os jesuítas de Santa Cruz pagariam duzentos bois e cem caixas de açúcar, a título de resgate da cidade. E assim o fizeram. Em 1731, ela contava com dezoito currais. Quando os jesuítas foram expulsos, em 1759, a fazenda tinha 8.000 cabeças de gado bovino, 1.200 cavalos, 200 carneiros e alguns burros de trabalho. 

Segundo Freitas, só para o consumo da Fazenda se abatiam mil e quinhentas reses por ano. Todo mês eram distribuídas cinquenta e três reses para os pobres da localidade, até os padres franciscanos recebiam sua cota de carne mensal proveniente da Fazenda. Semanalmente era abatida uma rês, que era dividida, salgada e consumida pelos padres e hóspedes da Residência durante a semana. Em três festas por ano, algumas reses eram distribuídas entre os escravos. Mas os números de reses consumidas internamente e os hábitos de consumo alimentar “nobres” dos padres e seus convivas podem nos enganar a respeito das finalidades comerciais da criação de gado. Uma discussão entre os padres ilustra bem que não se esquecia do que era a prioridade.

Em algum momento da década de 1730, o Reitor do colégio propôs que se fizessem laticínios – queijo e manteiga – com o leite das vacas da Fazenda, para melhor prover os residentes e o colégio, o que iniciaria, portanto, uma atividade paralela na Fazenda. A essa sugestão se opôs veementemente o Padre Pedro Fernandes, administrador à época, alegando que todo o leite deveria ser destinado exclusivamente à alimentação dos novilhos, a fim de que fosse conseguido o grande objetivo da fazenda, que era formar o maior rebanho de gado vacum do continente. A sugestão do Reitor foi abandonada, visto que a venda de gado e carne era, sem dúvida, a maior fonte de renda do Colégio do Rio de Janeiro. 

Era um ponto comum da “economia moral” jesuíta para a gestão de suas fazendas, uma ‘especialização produtiva’ com base em uma avaliação bastante racional das potencialidades de cada sítio (Fazenda de Santa Cruz para criação de gado, Fazenda de Papucaia para produção de farinha de mandioca e fazenda do Colégio para a produção de açúcar). Por isso em Santa Cruz não havia engenhos de açúcar, e sequer se podia desviar o leite dos novilhos para outros fins. 

O gado em pé e a carne verde eram comercializados em circuitos distintos, tanto para o mercado interno quanto para navios estrangeiros, das mais diversas nacionalidades. Para o mercado interno, desde o século XVII o Colégio do Rio mantinha seu próprio açougue, no centro da cidade, que, mesmo ameaçando o monopólio do açougue do Senado da Câmara, garantido pela lei da época, continuou funcionando até a expulsão dos padres. Carne e gado, com autorização expressa do governador, podiam ser vendidos também para as embarcações ancoradas na Ilha Grande. Os jesuítas abasteciam navios vindos do Sul, chamados ‘peruleiros’ que, carregados de prata peruana, paravam no Porto de Sepetiba e faziam compra do gado, efetuando o pagamento em prata. Vendiam para todas as esquadras estrangeiras que lá abarcassem. Fica patente a inserção da produção agropecuária das fazendas jesuítas nos circuitos comerciais mais amplos, num caso típico de quebra de monopólio tanto das rotas quanto dos produtos pelo colonizador português. Assim, os dados sobre a produção agropecuária, seu consumo interno, sua distribuição entre os colégios e sua posterior venda ou remessa para a Europa indicam não somente os princípios da “defesa, a catequese e a subsistência própria”, como alardeavam os padres, mas uma estratégia econômica vigente para toda a Companhia, a busca por lucros e rendas, após saciadas as necessidades de víveres internas da Companhia. 

Segundo dados apresentados por Freitas, a Fazenda rendia trinta mil cruzados anuais (doze contos de réis), que eram entregues ao Reitor do Colégio do Rio de Janeiro todo segundo dia do ano, pelo Administrador, em mãos. O montante era acompanhado de relatório detalhado de sua origem e incluía o rendimento dos arrendamentos e aforamentos de terras e do aluguel de pastos, dados que nos indicam que o rentismo já existia, desde o tempo dos jesuítas, e que também contribuía, efetivamente, para o aumento dos rendimentos da Companhia. Na gestão do Padre Pedro Fernandes, este entregava apenas doze mil cruzados ao Reitor, em compensação, levava in natura o gado que seria consumido pelo Colégio ao longo do ano: quinhentas reses. Presume-se que o dinheiro “das coisas nela vendidas”, sobretudo do gado, era remetido a Lisboa. Com isso, o Colégio do Rio era considerado “o mais desafogado da província do Brasil”, e podia mesmo contribuir para outros colégios e prédios da Companhia.

O enriquecimento possível através de tamanha estrutura produtiva ficava patente nas obras e benfeitorias deixadas pelos jesuítas, em parte utilitárias, em parte elemento de ostentação da riqueza da própria Ordem, para os que passassem pela Fazenda. Em 1751 a Igreja estava plenamente concluída, com vinte e cinco metros de comprimento do corpo central, com todas as paredes internas cobertas de painéis de azulejos e ricos objetos de culto “todos de ouro, prata e pedras preciosas”. Em 1752, foi inaugurada a “Ponte dos Jesuítas”, em pedra de cantaria, que era de fato uma represa, com quatro óculos por onde passavam as águas do Rio Guandu. No momento de sua expulsão, em 1759, os jesuítas estavam construindo um imenso templo, “destinado a ser o maior do continente”, com cripta anexa para jazigo dos padres.

A sede da Fazenda era formada por um bloco principal que unia igreja e convento, o “Convento dos Padres”, e outros pequenos prédios, formando um conjunto arquitetônico amplo e organizado, também reformado em meados do século XVIII. No Convento, com dois pavimentos e claustro central, havia trinta e seis celas individuais e ainda uma hospedaria, podendo alojar cerca de cinquenta pessoas. A residência também tinha por finalidade acolher os missionários das aldeias, estudantes, mestres e irmãos graduados em suas férias anuais, para seu “merecido repouso”. Ela também hospedou bispos, governadores e ministros com todo o conforto possível na época."

Manoela da Silva Pedroza é Historiadora.
Doutora em História pela Universidade Federal Fluminense, autora da tese "Capítulos para uma história social da propriedade da terra na América Portuguesa. O caso dos aforamentos na Fazenda de Santa Cruz (Capitania do Rio de Janeiro, 1600-1870)".

Fonte do Texto: Trechos extraídos da tese "Capítulos para uma história social da propriedade da terra na América Portuguesa. O caso dos aforamentos na Fazenda de Santa Cruz (Capitania do Rio de Janeiro, 1600-1870)". UFF, Niterói, 2018. Páginas 152 à 156.

Legenda e Fonte da Imagem: Carvalho, Delgado. Chorographia do districto federal. Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves, 1926. Retirada da página 152 da tese da autora, Manoela da Silva Pedroza.

Postado neste blog por Adinalzir Pereira Lamego

quarta-feira, julho 22, 2020

O maior acidente natural da história do Brasil ocorreu no Rio de Janeiro



Uma cruz de 10 metros na subida da Serra das Araras (Piraí-RJ), no local conhecido por Ponte Coberta, marca o início de um enorme cemitério construído pela natureza. Lá estão cerca de 1.400 mortos (fora os mais de 300 corpos resgatados) vítimas de soterramento pelo temporal que atingiu a serra em janeiro de 1967. Foi a maior tragédia natural da história do país.

No episódio da Serra das Araras, suas encostas praticamente se dissolveram em um diâmetro de 30 quilômetros. Rios de lama desceram a serra levando abaixo ônibus, caminhões e carros. A maioria dos veículos jamais foi encontrada. Uma ponte foi carregada pela avalanche. A Via Dutra ficou interditada por mais de três meses, nos dois sentidos.


Para se ter uma ideia do que ocorreu na Serra das Araras basta comparar os índices pluviométricos. A tragédia de Teresópolis ocorreu após um volume de chuvas de 140 mm em 24 horas. Na Serra das Araras, em 1967, o volume de chuvas chegou a 275 mm em apenas três horas. Quase o dobro de água em um oitavo do tempo.


Mas o episódio da Serra das Araras parece ter sido apagado da memória do país e, especialmente, da imprensa. O noticiário dos veículos de comunicação enfatiza que a tragédia da Região Serrana do Rio superou o desastre de Caraguatatuba em março de 1967. O caso da Serra das Araras, ocorrido em janeiro daquele mesmo ano foi muito maior e quase não é citado.


O resgate era das tarefas mais difíceis. Com uma corda amarrada a seus corpos, sete homens desciam por crateras cheias de cadáveres, pegavam corpo por corpo e eram puxados para cima. A missão foi dada pela polícia a um grupo de prisioneiros que estava na delegacia de Piraí. Pela ajuda na operação, o grupo ficou conhecido como “os sete homens bons”.

A enxurrada soterrou o ônibus da Viação Única, que precisou ser serrado ao meio para a retirada dos corpos.

Texto originalmente postado na página Geografias Memoráveis

Créditos das imagens: José Vasco / O Globo

Quer saber mais sobre esse acidente? Acesse o link abaixo:

Postado neste blog por Adinalzir Pereira Lamego

segunda-feira, julho 20, 2020

Capela de Santo Antônio do Pobres ou Igreja Matriz de Nossa Senhora do Desterro?



Tenho toda a certeza que essa igreja vista por Maria Graham, que eu cito no meu livro Viajantes Estrangeiros na Zona Oeste Carioca no Século XIX durante a sua viagem para Santa Cruz pode ter sido mesmo a Capela de Santo Antônio dos Pobres. Capela essa que teve seu início em 1725, na Fazenda de Inhoaíba, mais tarde denominada Fazenda Cafezal, do Capitão Luis Barata. Em cujas terras estava localizada essa Capela. 

Em 1893 o governo republicano adquiriu do Alferes Manuel Fernandes Barata, um terreno para a construção de um novo cemitério público para Campo Grande. É bom lembrar que nessa época o cemitério de Campo Grande estava situado em frente à Igreja Matriz de Nossa Senhora do Desterro.

Correio da Manhã - RJ 

Eu Sei Tudo: Magazine Mensal Illustrado

Mapa do Município Neutro - Capital - Rio de Janeiro

Mas devido ao avanço demográfico e a necessidade de aumentar a área do novo cemitério. A Capela de Santo Antônio que havia nas terras adquiridas foi demolida. Restando em seu lugar o hoje cemitério de Santo Antônio, que a população local chama de Cemitério de Campo Grande. Nem mesmo a destruição do Santuário foi capaz de diminuir o fervor religioso do povo local que assumiu o compromisso de reconstruí-la em outro lugar o mais rápido possível. O que levou a criação da Irmandade do Glorioso Santo Antônio dos Pobres.

Foto: Deca Serejo - Agosto 2018

Foto: Rio Pax - Internet

Na época, o Presidente da Irmandade, o Sr. Manoel Montes Trancoso, doou um terreno localizado na Estrada Real de Santa Cruz (atual Avenida Cesário de Melo), número 355, na então chamada curva do Matoso para a construção daquele que seria o novo templo. E que se encontra lá até hoje.

A pedra fundamental foi lançada no dia 13 de junho de 1931, data em que se comemorou o sétimo centenário de morte do padroeiro. Estiveram presentes o Núncio Apostólico, Sua Excelência Dom Aloisi Masella, Padre Felício Magaldi (Vigário de Campo Grande), Padre Olympio de Mello (Vigário de Santa Cruz) e uma grande parcela do povo campo-grandense. Por toda a noite daquele dia houve uma grande festa no local com queima de fogos, leilão e diversas brincadeiras típicas.

A festa de Santo Antonio dos Pobres, também conhecida como Festa da Curva, passou então a integrar durante muitas décadas o calendário religioso e cultural daquela região. Com o decorrer do tempo e devido ao processo de urbanização do local, a comunidade religiosa foi reduzindo. O que fez com que muitas das atividades religiosas fossem transferidas para a Matriz de Nossa Senhora do Desterro de Campo Grande. No local, além do templo, foi criado o prédio da extinta creche Santo Antônio que prestava assistência a muitas crianças carentes. Cujos pais precisavam trabalhar e não tinham como pagar uma creche ou uma babá.

A Igreja ou Capela de Santo Antônio dos Pobres é a segunda mais antiga de Campo Grande, sendo apenas mais recente que a Igreja Matriz da Paróquia de Nossa Senhora do Desterro de Campo Grande datada do século XIX.

Igreja de N.Sª do Desterro, 1673. Campo Grande. Desenho de Maria Graham, 1823 Museu Britânico

"A viajante inglesa Maria Graham provavelmente desenhou a Matriz da Freguesia de N. S. do Desterro de Campo Grande e a assinalou como sendo a "Freguesia de Santo Antônio", por engano. E tem mais um detalhe. Observando o desenho feito por ela, a Matriz ainda não possuía as torres sineiras em 1821. Que foi o ano que Maria Graham esteve no Rio de Janeiro". Segundo observações feitas pelo amigo Paulo Clarindo.

Fontes utilizadas: 
Maria Graham. Diário de uma viagem ao Brasil. Editora Itatiaia, 1990.
Viajantes Estrangeiros na Zona Oeste Carioca no Século XIX. Letra Capital, 2019.
https://riodecoracaotour.com.br/a-historia-do-cemiterio-de-campo-grande/ Acesso em 20 jul 2020.

Pesquisa feita por Adinalzir Pereira Lamego. Com a colaboração de José Luiz Teixeira e Paulo Clarindo do IAPAC e IHGI.

domingo, julho 19, 2020

Aldeia de caboclos em Cantagalo



Aldeia de caboclos em Cantagalo, Rio de Janeiro, Brasil. 1834 - 1839. Litografia colorida à mão. Jean-Baptiste Debret (Paris, França, 1768 - 1848, Paris, França)

Dedicado à Academia de Belas Artes do Instituto de França. Publicado em Viagem Pitoresca e Histórica ao Brasil (1834-1839), onde o pintor e litógrafo francês Debret documentou aspectos da natureza, do homem e da sociedade brasileira no início do século XIX, que ele conheceu enquanto aqui esteve entre 1817 - 1831.


Postado neste blog por Adinalzir Pereira Lamego

sábado, julho 18, 2020

A tarefa do historiador



“A principal tarefa do historiador não é julgar, mas compreender, mesmo o que temos mais dificuldade para compreender. O que dificulta a compreensão, no entanto, não são nossas convicções apaixonadas, mas também a experiência histórica que as formou. As primeiras são fáceis de superar, pois não há verdade no conhecido, mas enganosos dito francês tout comprendre c´est tout pardonner (tudo compreender é tudo perdoar). Compreender a era nazista na história alemã e enquadrá-la em seu contexto histórico não é perdoar o genocídio. De toda forma, não é provável que uma pessoa que tenha vivido este século extraordinário se abstenha de julgar. O difícil é compreender.” 

HOBSBAWM, Eric. A era dos extremos: o breve século XX. São Paulo: Cia das Letras, 1995. p. 15

Postado neste blog por Adinalzir Pereira Lamego

Charles Darwin e sua passagem pelo Recife

Charles Darwin no Rio de Janeiro. Por João Antônio Vieira

Charles Darwin quando esteve no Recife, se impressionou com a brutalidade das pessoas e escreveu: "É uma terra de escravidão, portanto de decrepitude moral!"

Em sua travessia pelo norte fluminense, Darwin deparou-se também com os horrores da escravidão. Dois episódios lhe marcaram profundamente. Um deles aconteceu na Fazenda Itaocaia, em Maricá, a 60 km do Rio, no dia 8 de abril, quando um grupo de caçadores saiu no encalço de alguns escravos. A certa altura, os foragidos se viram encurralados em um precipício.

Uma escrava, de certa idade, preferiu atirar-se no abismo a ser capturada pelo capitão do mato. "Praticado por uma matrona romana, esse ato seria interpretado como amor à liberdade", relatou Darwin. "Mas, vindo de uma negra pobre, disseram que tudo não passou de um gesto bruto".

Após sair do Brasil escreveu: "Nunca mais ponho os pés em um país escravocrata! No Recife um jovem mulato era constante e brutalmente espancado pelo seu senhor. Até hoje, quando escuto um grito na madrugada penso que é um escravo brasileiro e tremo todo. Em Salvador e no RJ as donas de casa tinham tarrachas para esmagar as articulações dos dedos dos escravos domésticos. E aos domingos iam à igreja, onde diziam amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo".

Fonte: Livro Viagens de um naturalista ao redor do mundo, Darwin, dedica várias páginas de sua estadia no Brasil em 1832.

Postado neste blog por Adinalzir Pereira Lamego

sexta-feira, julho 17, 2020

O Acervo Iconográfico da Biblioteca Nacional



Biblioteca Nacional incentiva a leitura durante a quarentena e disponibiliza acervo virtual de obras editadas pelo Centro de Pesquisa e Editoração (CPE).

Por meio dos editais do Programa Nacional de Apoio à Pesquisa e do edital de Coedição sem Ônus, a Biblioteca Nacional edita uma série de livros, teses e artigos. Visando estimular a leitura e a difusão do conhecimento durante o período de quarentena, a FBN disponibilizará gratuitamente diversas obras editadas pelo CPE em formato digital, para leitura ou download.

O Acervo Iconográfico da Biblioteca Nacional - Lygia da Fonseca Fernandes da Cunha (2010)

Não existe história sem memória. E não há memória sem preservação, organização e conhecimento das fontes. Foi esta moderna compreensão do papel das bibliotecas e dos bibliotecários que pautou, por mais de cinquenta anos, a fecunda atuação da bibliotecária, museóloga e pesquisadora Lygia da Fonseca Fernandes da Cunha.


Originalmente postado em bibliotecanacional @instagran

Postado neste blog por Adinalzir Pereira Lamego

quarta-feira, julho 15, 2020

Qual o mais antigo loteamento em Campo Grande?



Esse loteamento que hoje atende por Vila Comari, teve início em 1919 e o arruamento em 1926, talvez seja o mais antigo loteamento em Campo Grande, significa dizer que este loteamento não teve sua origem nos terrenos dos sítios que eram produtores de laranja no bairro.⁣⁣ É um dos poucos lugares no bairro de Campo Grande que rende homenagem ao notável botânico Freire Alemão, natural do Mendanha.⁣⁣
⁣⁣
⁣Os nomes Comary, Baycuru, Ituassu, Jupaty, Flora, Catiara, Jissara, Avaré são alusivas a botânica numa clara referência ao Freire Alemão. A homenagem ao botânico Francisco Freire de Alemão Cysneiros, não é uma mera coincidência, a proprietária do terreno para construção do loteamento Vila Independência era nada mais, nada menos que Maria Freire Vasconcellos, sobrinha do botânico e viúva do Senador Augusto Vasconcellos.⁣⁣
⁣⁣
Originalmente postado em riodecoracaotour

Postado neste blog por Adinalzir Pereira Lamego

D. Pedro II, a cachoeira de Paulo Afonso e as pulgas



Durante a sua viagem às províncias do Norte, em outubro de 1859, D. Pedro II deixou D. Teresa Cristina em Salvador e entrou pelo Rio São Francisco até a Cachoeira de Paulo Afonso .

D. Pedro II seguiu viagem com os seus passos sendo cobertos pela imprensa nacional. No Rio de Janeiro sabia-se dos locais que ele estava visitando e, assim, se cristalizava a imagem do estadista preocupado em conhecer a nação que governava. O grande sacrifício de d. Pedro II, chegar a Cachoeira de Paulo Afonso em 20 de outubro de 1859, foi estampado no Jornal do Comercio do Rio de Janeiro:

"Sua majestade sentiu arroubado seu espírito; assentou-se num rochedo, largamente mirou tudo nessa primeira e profunda emoção, que se não revela, mas que se sente; que se receia ver perdida se algum objeto estranho no-la perturba. (...)

Depois, o imperador desenhou todo aquele majestoso painel, e contemplando-o de novo, como para grava-lo no seu pensamento, levantou-se e foi percorrer todo o espaço da cachoeira.

Realmente, d. Pedro se encantou com o lugar, que assim descreveu em seu diário:

"Partimos do Salgado às 2 da madrugada e chegamos a Paulo Afonso pouco depois de 5 ½. Na distância de menos de légua é que se ouviu o ruído da cachoeira. Logo que me apeei comecei a vê-la [...]. É belíssimo o ponto de que se desdobram 7 cachoeiras que se reúnem na grande que não se pode descobrir daí, [...]; o arco-íris produzido pela poeira de água completava esta cena majestosa."

Obviamente que para a aventura foi preciso coragem e sair da sua zona de conforto. Na Bahia, para ver a cachoeira, se hospedou em lugares não muito aprazíveis:

"Na fazenda dos Olhos d'Água fiquei mal acomodado na senzala – nome que convém à casa que aí há – mas sempre arranjei cama em lugar de rede e dormiria bem, apesar das pulgas, cujas mordeduras só senti no outro dia de manhã."

Legenda das Imagens:
1 - Desenho de D. Pedro II da Cachoeira de Paulo Afonso - Museu Imperial
2 - Pintura de Franz Post mostrando a Cachoeira de Paulo Afonso - Masp
3 - 1ª. Ed. Cachoeira de Paulo Alfonso - Castro Alves.

Originalmente postado em Paulo Rezzutti

Postado neste blog por Adinalzir Pereira Lamego

sexta-feira, julho 10, 2020

Ilha da Pombeba: a ilha que nasceu suja



O que mais o subúrbio tem (ou teve) é ilha e praia. Se eu for enumerar as praias e ilhas, ficaria aqui escrevendo o dia todo, mas minha intenção é mostrar a todos os leitores que precisamos resgatar a história suburbana, precisamos tecer essa concha de retalhos e montar um lençol histórico mostrando o que vivemos e o que perdemos.

Relatos de antigos (história oral) é uma fonte belíssima (claro que realizando a devida análise) de informações de o que perdemos em nome de um tal progresso. A Avenida Brasil, a favelização e a falta de preservação do poder público contribuíram para que perdêssemos nossa flora, fauna e geografia privilegiada.

Diversas pesquisas sobre as praias e as ilhas estão todos os dias explodindo pelas academias e pelas redes sociais. Estamos a cada dia descobrindo um “novo Rio de Janeiro”, ou seria um Rio esquecido? O compromisso de todos que pesquisamos o subúrbio é trazer até você leitor, tudo que desapareceu dos nossos olhos e está esquecido na nossa história.


Os campeonatos de remo realizados na Ponta do Caju tinham como fundo a ilha de Pombeba. Conhecida como a “ilha dos urubus”, é uma ilha artificial (contestável), formada a partir de dejetos de matérias de drenagem das obras do Porto do Caju. No local a natureza se refez, nasceu um bosque e no local atualmente possuí inúmeros pássaros e animais. O mais interessante que a ilha tem CEP próprio que é 21180-070. Infelizmente a ilha acumula muita sujeira e lixo por todos os lados. Seu tamanho atual é de 9.800 metros quadrados.


Como a ilha nasceu para despejo de sujeira, ela nada mais é que um reduto de doenças. A população do Caju reclamava isso já em 1918, onde o periódico "A Rua" mostra uma reportagem completa sobre isso.

A ilha durante anos foi usada por uma empresa como depósito de carvão e produção de gás. A Belmiro Rodrigues & Cia. Foi uma empresa grande e que durante anos manteve a ilha como depósito e ajudou a despejar produtos químicos em volta da ilha.



Antes da Baía de Guanabara virar um grande depósito de lixo a céu aberto, era comum pequenos barcos fazerem transportes por dentro dela. Pessoas pegavam barcos na Praça XV para ir para Maria Angú, Porto de Inhaúma e tanto outros lugares. Um dos itinerários dessas embarcações passava justamente em frente a ilha, já que a ponta do Caju era usada como parada de barcos.

De onde vem esse nome Pombeba? Segundo especialistas a palavra tem alguns significados como: " A mão chata", "A fibra”, "Cipó chato". O que me faz pensar que existia um pequeno pedaço de terra. Uma reportagem de 1865 aponta um leilão de uma ilha de mesmo nome no Caju e que nela existia uma pequena fábrica de sabão, ou seja, ela não é artificial, ela tinha uma pequena parte em terra e foi aumentada devido a detritos das obras do porto. A ilha teve seu nome oficializado em 1965, no governo Lacerda.


Por Paulo Silva


Postado neste blog por Adinalzir Pereira Lamego

A saga da Marquesa de Santos após a morte da Imperatriz Leopoldina


Marquesa de Santos aos 68 anos - Wikimedia Commons

Acusada de ser responsável pela morte de Maria Leopoldina, Domitila de Castro foi perseguida pelo povo, mas isso não a impediu de reconstruir sua vida e ganhar fama de santa popular.

Ao longo dos anos, traição e monarquia foram duas palavras que andaram juntas e que ajudam a escrever, em muitos casos, grande parte da história de diversos países. Por aqui, por exemplo, um dos casos mais emblemáticos é de dom Pedro I com Domitila de Castro e Mello, a Marquesa de Santos.

Antes clandestino e sigiloso, o amor dos dois passou a ser cada vez mais escancarado, não sendo escondido nem mesmo de Maria Leopoldina da Áustria, esposa do imperador. Com o passar do tempo, Domitila passou a ser mais amada e elevada socialmente por dom Pedro. Mas em 11 de dezembro de 1826, um trágico evento mudou tudo isso: a morte da Imperatriz Leopoldina.

A conturbada relação pós-Leopoldina

Tudo começou porque Maria Leopoldina era querida pelo povo, que via na monarca uma admiração extrema em virtude de seu papel na luta pela independência. Logo, eles passaram a querer vingança contra aquela que seria a responsável pela morte da imperatriz. Naquela época, corriam boatos que a amante teria envenenado Maria Leopoldina.

A Marquesa de Santos e a Imperatriz Leopoldina / Crédito: Wikimedia Commons

Com isso, governantes e conselheiros decidiram afastar a Marquesa de Santos da corte, já que a cidade estava cada vez mais ensandecida, o que culminou com que o coronel Oliva, cunhado da marquesa e acusado de participar do envenenamento de Leopoldina, fosse alvejado com dois tiros.

Mas a confusão não parou por aí, uma multidão se dirigiu até a casa da marquesa, que foi cercada, apedrejada e por pouco não foi invadida. Todo esse contexto fez dom Pedro I ficar cada vez mais impopular e o relacionamento dos dois passou a ser bem mais conturbado, terminando em 1829.

Naquela ocasião, o imperador se casou com Amélia de Leuchtenberg em uma tentativa de restaurar sua imagem. Havia mais de dois anos que o imperador procurava uma noiva de sangue nobre, mas seu relacionamento com Domitila e tudo que ele causou para Maria Leopoldina fez com que muitas princesas recusassem se envolver com ele.

Já a Marquesa de Santos parece também ter superado a união e virou a página em 1833, quando conheceu o brigadeiro Rafael Tobias Aguiar. No ano seguinte, ela retornou para São Paulo, onde adquiriu um vasto casarão na antiga Rua do Carmo — atual Rua Roberto Simonsen —, no centro da cidade.

Em 1842, Domitila se casa com Tobias Aguiar, mas a relação passa por um momento delicado quando o brigadeiro, um dos principais líderes da Revolução Liberal, acaba preso no sul. Sabendo que o marido havia sido levado para o Rio de Janeiro e encarcerado na Fortaleza da Laje, ela roga a dom Pedro II que pudesse viver com o marido na Fortaleza para que pudesse cuidar de sua saúde — o que acabou sendo concedido.

Dois anos depois, o brigadeiro acaba sendo anistiado e os dois retornam para São Paulo, onde foram recebidos com muita festa. A união entre Tobias e Domitila foi o mais longo da marquesa, durando 24 anos. Juntos, o casal teve seis filhos, sendo que 4 conseguiram chegar a fase adulta. Os dois só se separam quando o brigadeiro faleceu a bordo do Vapor Piratininga em 7 de outubro de 1857, quando ia até o Rio de Janeiro em busca de uma ajuda médica.

O fim da vida de Marquesa de Santos

Em sua velhice, Domitila se tornou uma senhora devota e caridosa, ajudando os desamparados, protegendo os enfermos e miseráveis, e ajudando os estudantes da Faculdade de Direito do Largo São Francisco, no centro da cidade de São Paulo. A casa da Marquesa se tornou um centro da sociedade paulistana, que foi animada com bailes de máscaras e saraus literários.

Domitila de Castro aos 68 anos e sua sepultura no Cemitério da Consolação / Crédito: Wikimedia Commons

Domitila de Castro faleceu em seu palacete, que é a atual sede do Museu da Cidade de São Paulo, em 3 de novembro de 1867, sendo sepultada pouco depois no Cemitério da Consolação. Seu túmulo sempre recebem flores de pessoas que a consideram uma santa popular, afinal, existe uma lenda que a Marquesa protege as prostitutas da cidade.

Por Fabio Previdelli

Originalmente postado em AH - Aventuras na História

Postado neste blog por Adinalzir Pereira Lamego

O bairro imperial de Santa Cruz


Vista do Castelo Imperial de Santa Cruz, do livro 'Viagem pitoresca e histórica ao Brasil', publicado em 1839 por Jean-Baptista Debret - Divulgação/Arquivo Nacional.

Região abrigava a Fazenda Imperial e era onde D. João VI fazia suas caçadas.

Rio - Chegando ao centro de um dos bairros mais populosos do Brasil, encontramos um bloco de pedra bem em frente a uma loja de eletrodomésticos: ali, o Marco 11, demarcava a chegada nas terras imperiais de Santa Cruz, localizando quem vinha da então distante cidade, rumo aos interiores. A viagem começava em outro bairro também imperial, o de São Cristóvão, onde fica o palácio da Quinta da Boa Vista, residência real.

Quando falamos sobre o passado imperial do Rio de Janeiro, lembramos do Paço Imperial, no centro da cidade, e de São Cristóvão, que leva o título de bairro imperial em seu nome. Porém, esquecemos de outro bairro imperial, que acaba ficando - literalmente - nas margens da história.

Santa Cruz guarda em algumas ruas e prédios do bairro o seu passado histórico: em seu centro, temos as ruas D. Pedro I, Dona Januária e a Avenida Isabel; indo em direção à Avenida Brasil, passamos em frente ao hospital D. Pedro II, que tem à sua frente os muros de pedra da Casa do Sal, onde os trabalhadores da Fazenda Imperial recebiam seus salários. A sede desta mesma fazenda hoje abriga o 1º Batalhão de Engenharia de Combate Villagran Cabrita.

Antes de Petrópolis, o local era onde as famílias imperiais tiravam seus dias de veraneio. Era onde, por exemplo, D.João VI fazia suas caçadas e seus filhos, Pedro e Miguel, praticamente cresceram.

Conta a história que foi por lá também que o já crescido e futuro herdeiro do trono brasileiro, Pedro I, teria se reunido com José Bonifácio antes de declarar a independência do Brasil. Não só isso: teria sido onde o mesmo imperador passou seus dias de lua de mel com a princesa Leopoldina.

E foi com D. Pedro II, em 1842, que na Fazenda de Santa Cruz se instalou o primeiro telefone do Brasil, que ligava a localidade ao Paço Imperial.

Esses são só alguns fatos de uma história pouco contada nas páginas oficiais de nossa cidade, o que só prova que os subúrbios têm muito o que dizer não só para os cariocas, como para o Brasil!

Caminho Imperial
Quem anda por alguns bairros dos subúrbios já se deparou com uma placa de aviso: "Caminho Imperial". Acontece que esse caminho é aquele mesmo que levava a realeza brasileira de São Cristóvão a Santa Cruz. O caminho tem o mesmo traçado até hoje e passa por importantes ruas e avenidas das zonas Norte e Oeste. São elas: Rua São Luís Gonzaga, Avenida Dom Hélder Câmara, Avenida Ernani Cardoso, Estrada Intendente Magalhães, Avenida Marechal Fontenelle, Avenida Santa Cruz, Rua Artur Rios, Avenida Cesário de Melo e Rua Felipe Cardoso.

Matadouro público
Em 1881, com a presença do imperador D. Pedro II, é inaugurado oficialmente o matadouro que abasteceria de carne toda a cidade do Rio de Janeiro com o gado criado nas terras da fazenda e em propriedades particulares próximas. O matadouro foi transferido para o local em meados do século 19 e funcionou até a segunda metade do século 20. Um pouco afastado do centro do bairro, suas ruínas hoje dividem o terreno com uma escola técnica da FAETEC, no Largo do Bodegão. O palácio Princesa Isabel, que era a sede administrativa e residência do veterinário do local, hoje abriga o NOPH - Ecomuseu de Santa Cruz.
                  
Por Vitor Almeida
Coluna Rio Suburbano

Originalmente postado em O DIA

Postado neste blog por Adinalzir Pereira Lamego

segunda-feira, julho 06, 2020

Uma ilha em Irajá: A historica e aprazível ilha de Saravatá


Aparece nos mapas mais primitivos como Ilha de GRAVATÁ ou GARAVATÁ, que passou a ser chamada de ILHA DE SARAVATÁ do século XVIII até o fim do XX, quando então foi extinta através de inúmeros ATERROS na região. Todos esses nomes derivam do tupi "karawá tã", que significa "planta que fura", em português "carauatá", nome de uma bromeliácea, cujo fruto se assemelha a um abacaxi sem coroa.

Localizava-se na localidade entre o atual Trevo das Missões (início da Rodovia Washington Luiz) no seu lado direito e a Linha Vermelha. Precisamente onde hoje ficam as empresas Cargo Park e Arm Rio Petrobrás. No passado, ficava em frente a antiga foz do Rio Meriti, onde ficava o Porto Velho de Irajá e a Pedra do Lagarto. Na época a região pertencia a Freguesia de N. S da Apresentação do Irajá, por isso Irajá. Hoje é divisa do bairro de Cordovil com o município de Duque de Caxias.

Importante citar que nos primórdios da colonização, era chamada de ILHA DAS OSTRAS, devido a quantidade desse molusco na região. Um dos proprietários dessa ilha no final século XVII, foi o capitão Luiz Machado Homem, também dono do Engenho de Nossa Senhora da Graça (atual Vigário Geral) por volta de 1670, como cita um artigo do memorialista Brasil Gerson em 1969:


"...Luiz Homem [...] autor de muitos e frequentes protestos as autoridades contra os intrusos que a infestavam em sua faixa marítima, na sua Ilha das Ostras, em busca de matéria prima para cal que fabricavam com prejuízo para ele, dono dela, na foz do Rio que dizia ser do Irajá, e que, entretanto, era do Meriti."

Na Revista do Instituto Histórico de 1881 também foi chamada de ILHA DO CAMARÃO:

"Saravatá - Ilha comprida entre a foz do rio Merity e a Ilha do Governador; é bastante arborisada e são afamadas as suas frutas. Alguns dão-lho o nome de ilha do Camarão, por ter sido por muitos annos propriedade do Francisco Pereira Camarão, fallecido ultimamente, e que tinha ahi uma grande caieira."

Note que o trecho cita que na ilha havia uma caieira, isto é, um forno onde se calcinava as conchas e ostras para fabrical cal, estando de acordo com as informações anteriores.

Em Antiqualhas e Memórias do Rio de Janeiro de 1903, o Dr. José Vieira Fazenda também cita a denominação antiga:

"Em todos esses papéis fala-se em lugares que perderam a antiga denominação, tais como ILHA DAS OSTRAS, na boca do rio Miriti, rio dos Cachorros, Miriti Doce e Miriti Salgado, Ponta Grossa, etc."


Esses papéis por ele citado, ser referem a um processo de 1782, sobre a invasão de terras vizinhas a ilha, que eram realengas. Ou seja, de uso público, pertencentes ao senado da câmara. O texto contesta que a defesa de Thereza Angélica de Jesus, como forma de enganar, utilizava-se de antigas denominações de localidades que já haviam se tornado desconhecidas até naquela época. 

Nesta mesma publicação, em Antiqualhas e Memórias do Rio de Janeiro, diz também sobre a ilha: "...Saravatá, célebre por suas frutas do conde".

Segue registros de escrituras de venda que mostram que após Luiz Machado Homem, a ilha logo passou pelas mãos de outros proprietários:

"Escritura de venda de uma ilha que fazem o Doutor Inácio Cardoso de Azevedo e sua mulher Branca Maria Coutinha a Francisco de Sá Souto Maior - Ilha de Sareguatá (Saravatá), sita defronte do porto de Irajá, com suas benfeitorias e um saveiro, herdada de seus pais e sogros Agostinho de Paredes e sua mulher Ana de Azevedo Coutinho, sem foro nem pensão alguma." (03/04/1709 - 1º Ofício de Notas - Disponível no Arquivo Nacional)

Ou: "Escritura de venda de uma ilha que faz José Barbosa de Sá a José Fagundes Amaral - ilha de Saravatá, com casas de vivenda, sita defronte da barra de Irajá, havida por folha de partilha dos bens de sua mãe." (28/03/1722 - 1º Ofício de Notas - disponível no Arquivo Nacional)


Nesta época eram raras as propriedades que permaneciam nas mãos da mesma família. Tanto as ilhas, como engenhos e etc, eram constantemente negociadas, quando não perdiam através de hipotecas ou como fiadores. Outra prova desta rotatividade, é que nas visitas pastorais de Monsenhor Pizarro, ao fim do século XVIII, a ilha é relatada como propriedade de Inácia Maria, sendo citada na relação dos oratórios da região:  "...de Inácia Maria, na Ilha chamada Sarauatá, vizinha, ao porto Velho, em distância de 1. 1/2 legoa, com pouca diferença para o mesmo rumo..."

Chegado o final do século XIX, a ilha que nesta altura era propriedade da Marinha, foi arrendada a Abreu Mayrink Veiga, onde a firma Mayrink Veiga & Cia estabelece um depósito de pólvora. Em 1915 ocorre uma grande explosão! A firma havia comprado do Ministério da Guerra um carregamento de 30 toneladas de pólvora, que explodiram, eliminando qualquer vestígio do depósito, destruindo as casas da ilha, arremeçando árvores, trilhos e vagões para longe e deixando uma cratera de 10 metros de profundidade. A família do vigia que habitava a ilha foi resgatada por um intendente de polícia que viu a explosão da Ponta do Galeão (Ilha do Governador) e veio de canoa. Como era noite, houve um clarão que segundo relatos, foi visto até em Niterói. O estampido foi ouvido da Gávea e os tremores sentidos de Madureira. Alguns lugares da Ilha do Governador, como Flexeira, Itacolomy, Tubiacanga e Galeão sentiram o impacto da explosão em algumas construções, com vidraças quebradas. 


Nas décadas seguintes, o neto de Abreu, Sr. Antenor Mayrink Veiga, já proprietário da ilha, constrói uma casa de veraneio na mesma. Tamanha a beleza da ilha, dos seus arredores e da construção, a casa chegou a receber ilustres da época como Fernando Delamare, Walter Moreira Salles, o embaixador português Walter Prytman, o prefeito de Nova York Robert Wagner, entre outros. Além disso, a propriedade era cedida constantemente para pic-nics e confraternizações de clubes da época, como o Clube Olympico (da Cinelândia), City Bank Club, Cube Ginástico Português, onde desembarcavam os sócios vindos de barco desde a Praça Mauá. Há também relatos de passeios a barco na região, realizados esporadicamente pela Companhia Cantareira, que passava por várias ilhas suburbanas hoje extintas, até chegar a localidade. Além de ter sediado um churrasco oferecido pelo Aero Club do Brasil (que ficava em Manguinhos) ao General Eurico Gaspar Dutra, até então Ministro da Guerra, posterior presidente do Brasil. 

Com essse relatos, imagine a beleza desta ilha suburbana! A região era rica em robalos, tainhas, paratys, merótes e vermelhos, além de siris e ostras, que maravilha!

Em seguida foi instalada alí a Rádio Mayrink Veiga, onde em 1948, foi recepcionado em passeio e almoço, os membros do Racing Club de Buenos Aires, participantes de uma partida amistosa contra o Fluminense nas Laranjeiras. Tamanho aconhego de tais instalações e beleza natural da região, a Ilha de Saravatá foi até escolhida como concentração da seleção brasileira para a Copa de 1950, fato dado como certo até os dias anteriores ao torneio. Em uma última visita do técnico Flávio Costa e dirigentes da CBD, verificou-se que apesar de ótimas instalações, a ilha sofria com a falta de abastecimento d'água, havendo então uma mudança de planos.

Veja que era uma ilha carregada de história!

Não obstante, também carregada de lendas, como a do tesouro escondido. Rezava que piratas fugidos da marinha britanica, esconderam um tesouro nos porões de um convento jesuíta que havia na localidade. Curioso que essa lenda também foi muito atribuída a uma ilha vizinha, a Ilha do Raimundo. Contudo, a partir de uma reportagem do Diário da Noite na década de 50, um funcionário da família Mayrink Veiga afirmava que foi desse tesouro que iniciou-se a fortuna da família. Balela! A lenda ainda se fortaleceu devido a uma contrução antiga aos fundos da ilha, localizada atrás de uma colina, onde segundo os reporteres havia um túnel com 500 metros de comprimento que a ligava ao continente. A reportagem também narrava outra lenda, de que a ilha era mal assombrada e amaldiçoada. O funcionário da família relatava aparições de fantasmas e também dizia que nesse túnel foram aprisionados muitos escravos chegados na região. Fatos curiosos, mas não passam de lendas e não coadunam com os registros apresentados até aqui, pois há registros de que a ilha já havia tido diversos donos desde o período colonial, até chegar as mãos da Marinha, sendo impossível um tesouro permanecer até a época que a mesma aforou ao Sr. Abreu Mayrinck Veiga. 


O formato da ilha era comprida e, como já dito, ficava em frente ao Porto Velho de Irajá, na foz do Rio Meriti. Mas fazia fundos com a Ponta do Franco, depois chamada de Ponta da Mãe Maria e Flexeira, na Ilha do Governador. Na ilha havia uma colina, na qual havia um marco de pedra trabalhada, com cabeça em formato de prisma quadrangular, protegido por uma cobertura piramidal revestida de madeira. Se tratava do marco geodésico do Serviço Geográfico Militar.

Pra finalizar, segue um impactante relato do naturalista Magalhães Correa em 1936, que nos trás a idéia de quão pitoresca era a paisagem local:

"...a esquerda colossaes árvores, duas marajubeiras [...] ao norte do campo, seis tamarineiras [...] atravessamos uma plantação de fruteiras, as quais deram outrora, a fama a ilha pela selecção das deliciosas frutas [...] a mata cerrada; parecia que atravessavamos uma floresta [...] nesse trajecto foram notadas as seguintes árvores: pao dálho ou guararemas, mangueiras, jaboticabeiras, goiabeiras, araçazeiras, pitangueiras, jaqueiras, cajueiros; perto da habitação, mamoeiros, cafeeiros, bananeiras. Em plena matta, imauba, cambuhy, camboatá, massambará, bico de pato ou sete cascas, jacaré, algodão da praia; entre as palmeiras, o côco de cotia, esguio, de belo porte; o da bahia, baba de boi e de catharro; nas estipes dos coqueiros sumarés, orchidaceas. As árvores como em gala, ostentavam festões de baba de velho [...] por todos os lados encontramos a marajubeira [...] Isoladas, piteiras e sobre as velhas arvores veluzziaceas [...] gambá, que há muito, assim como lagartos, principalmente os tiejus, entre as aves paludicas a piaçoca, saracura, garças, socó e marrequinhas; da matta, as pombas, jurity, parary, rolinha e jacus [...] e inumeros passaros canoros e gritadores [...] espirais de borboletas, vermelhas, amarellas, rajadas de preto e amarello, eurema, blathea, pieris phyrro e danais, erippus, um verdadeiro encanto. Essa ilha é digna do paraíso, pela poesia e encantos [...] concurso da própria natureza e torna-se-á privilegiada pela sua posição geographica e belleza tropical, vivenda sonhada nos contos das fadas [...] compõem uma bella tela, só faltando o artísta para reproduzi-la. Tudo nela é bello, agradavel e romantico." 

Essa era a aprazível Ilha de Saravatá, numa época onde a Baía de Guanabara era o verdadeiro paraíso, que tanto apaixonou viajantes estrangeiros que por aqui passaram! 

A ilha foi extinta pelos inúmeros aterros em nossa Baía de Guanabara, que agoniza como um depósito de lixo e esgoto.

Esse é mais um fragmento da história perdida do subúrbio carioca!

*Texto e pesquisa de minha autoria, Hugo Delphim.
*As fontes de pesquisa foram citadas no próprio texto. *Algumas imagens retiradas de periódicos antigos.

Originalmente postado em paulosilvahistory.blogspot.com

Postado neste blog por Adinalzir Pereira Lamego